TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.206 - Disponibilização: quarta-feira, 26 de outubro de 2022
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PROCESSUAL CIVIL. PROFESSOR DA REDE MUNICIPAL. PEDIDO DE RATEIO DA COTA PARTE DO VALOR REPASSADO AO
MUNICÍPIO, A TÍTULO DE AJUSTE DO FUNDEB. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL.
1. Sentença que julgou improcedente o pedido formulado na ação ajuizada por professora pública do Município de Santa Luzia/PB,
através da qual se objetivou, em face do ajuste financeiro feito pelo MEC com a municipalidade, que, pelo menos, 60% (sessenta por
cento) dos valores apurados sejam destinados ao pagamento dos professores, pugnando, por conseguinte, que seja ordenada por
sentença a obrigação de dividir o saldo restante com o magistério municipal.
2. Apelação interposta perante o Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, tendo o relator declinado da competência, sob o argumento
de que cabe à Justiça Federal analisar os casos de verbas da FUNDEB repassadas pela União para os municípios.
3. Hipótese em que não se cuida de discussão acerca dos recursos repassados ao Município, a título de FUNDEB, pela União. Caso
em que a ação foi ajuizada por uma professora da rede pública municipal de ensino, objetivando receber valor repassado ao Município,
como de ajuste dos valores do FUNDEB, não existindo qualquer relação entre as partes e o ente público federal.
4. A competência para processar e julgar a presente demanda é mesmo da Justiça Estadual. “A competência para processar e julgar
ação onde se discute o pagamento de vantagens salariais a professores, ainda que com recursos do FUNDEF, é, pois, da Justiça do
Estado. Conflito conhecido e declarado competente o Juízo de Direito da 2ª Vara de Barbalha-CE”. (STJ, Terceira Seção, CC nº 33398/
CE, julg. em 22-5-2002, DJ de 17-6-2002, pág. 188, unânime, Rel. Min. Felix Fisher).
5. Incompetência absoluta deste Tribunal Regional Federal para analisar o caso presente. Remessa dos autos, de ofício, ao eg. Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba.
Diferente é a situação na qual o ente federado intervém na lide. Não é o caso.
Trata-se de interpretação adequada do art. 109, I da CF/88, não sendo possível pressupor o interesse da União na demanda. Isso,
pois, efetivado o repasse da verba, ainda que por força de decisão judicial, os valores passam a ser administrados pelo ente municipal.
Inexistindo outras questões preliminares ou nulidades a serem conhecidas de ofício, passo à análise do mérito.
A lide diz respeito à destinação dos recursos recebidos pelo Município, em sua demanda judicial, os quais são provenientes de diferenças nos repasses a título de complementação do FUNDEF pela União nos anos de 1998 a 2002.
Com efeito, segundo art. 6º da Lei nº 9.424/96, não mais vigente, deveria a União complementar os recursos por ela repassados aos
demais entes federativos quando, no âmbito de cada Estado ou Município, seu valor por aluno não alcançasse o mínimo definido
nacionalmente.
O cálculo do Valor Mínimo Anual por Aluno teria subestimado o referido valor, limitando-se a atualizar anualmente os importes devidos
ao FUNDEF, o que teria resultado em um déficit nas transferências efetuadas aos demais entes.
Houve pacificação da matéria quando o STJ, em julgamento de recursos repetitivos, fixou no REsp 1.101.015/BA, tese interpretativa
do art. 6º, §1º, da Lei nº 9.424/96:
“(…) para fins de complementação pela União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental - FUNDEF (art.
60 do ADCT), com redação dada pela EC 14/96, o Valor Mínimo Anual por Aluno VMAA, de que trata o art. 6º, §1º, da Lei 9.424/96,
deve ser calculado levando em conta a média nacional. (relatoria do Min. Teori Albino Zavascki, DJe de 02/06/2010)”.
Se o motivo da condenação foram os depósitos insuficientes na conta vinculada do FUNDEF, então, o valor reposto deve atender à
finalidade do FUNDEF, devendo, portanto, tais recursos ter sua aplicação vinculada à educação.
Veja-se que o STF, no julgamento das ACOs ns. 648, 660, 669 e 700, condenou a União ao pagamento de diferenças relacionadas à
complementação do FUNDEF e determinou que os recursos recebidos devem ser destinados exclusivamente à educação.
Até esse ponto, não existe controvérsia.
O Debate reside em determinar se deve ocorrer a chamada subvinculação. Ou seja, se as diferenças obtidas pelo Município em sua
demanda judicial contra a União devem obedecer ao critério que impõe a aplicação de 60% (sessenta por cento) na folha de pagamento dos professores.
Incialmente, prevaleceu no âmbito dos tribunais de contas, a percepção de que a subvinculação não deve ocorrer, por razões de ordem
financeira, dada a natureza extraordinária da receita. Cito os Acórdãos n.º 1824/2017 e n.º 1962/2017 do TCU.
Em decisão de 2018, no MS 35.675, o Ministro Roberto Barroso decidiu entendendo que:
“[…] É verdade que, no julgamento das ações civis ordinárias nºs 648, 660, 669 e 700, o pleno desta Corte, ao confirmar a condenação da União ao pagamento da diferença do Fundef/Fundeb, manteve a vinculação da receita à educação . Esse fato, todavia, não
importa em reconhecer de forma automática que deva ser mantida a subvinculação de 60% para pagamento de remuneração dos
profissionais do magistério como requer a impetrante. A probabilidade do direito invocado é esvaziada, principalmente, por conta de
dois argumentos. Em primeiro lugar, o art. 22 da Lei nº 11.494/2007 faz expressa menção a 60% dos “recursos anuais”, sendo razoável
a interpretação que exclui de seu conteúdo recursos eventuais ou extraordinários, como seriam os recursos objeto deste mandado de
segurança. Em segundo lugar, a previsão legal expressa é de que os recursos sejam utilizados para o pagamento da “remuneração
dos professores no magistério”, não havendo qualquer previsão para a concessão de abono ou qualquer outro favorecimento pessoal
momentâneo, e não valorização abrangente e continuada da categoria. [...]”
A questão ressurgiu com a edição da Lei n. 14.057 de 11 de setembro de 2020, a qual previu a pagamento de abono aos professores.
Com efeito, a referida lei surgiu entre questionamentos quanto à sua constitucionalidade, dada a afronta à autonomia dos entes federativos municipais (visto que Lei Federal não pode criar despesas para o Município) e a impossibilidade de aplicação retroativo de seus
efeitos (disciplinar destinação de valor obtido por decisão judicial anterior).
Ocorre que em 21 de março de 2022, já com vigência da Lei n. 14.057/2020, o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento da
Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 528/DF e entendeu pela constitucionalidade do afastamento da subvinculação
e validade da decisão do TCU que a proibiu, senão vejamos:
EMENTA: DIREITO À EDUCAÇÃO. COMPLEMENTAÇÃO DOS RECURSOS DO FUNDEF/FUNDEB. COMO VERBAS DE NATUREZA EXTRAORDINÁRIA. CONSTITUCIONALIDADE DO AFASTAMENTO DA SUBVINCULAÇÃO QUE DETERMINA A APLICAÇÃO
DE 60% DOS RECURSOS ANUAIS TOTAIS DOS FUNDOS AO PAGAMENTO DA REMUNERAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DO
MAGISTÉRIO DA EDUCAÇÃO BÁSICA. IMPOSSIBILIDADE DO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS COM RECURSOS DO FUNDEF/FUNDEB. CARACTERIZAÇÃO DE DESVIO DE VERBAS CONSTITUCIONALMENTE VINCULADAS À EDUCAÇÃO. PRECEDENTES. CONSTITUCIONALIDADE DO ACÓRDÃO 1.824/2017 DO TRIBUNAL DE CONTAS DA
UNIÃO. INCIDÊNCIA DA EC 114/2021. IMPROCEDÊNCIA. 1. A orientação do TCU que afasta a incidência da regra do art. 22 da Lei
11.494/2007 aos recursos de complementação do FUNDEB pagos por meio de precatórios encontra-se em conformidade com os preceitos constitucionais que visam a resguardar o direito à educação e a valorização dos profissionais da educação básica. 2. O caráter